É bom ter inveja de Simão Cireneu?
O Professor Plinio Corrêa de Oliveira escreveu uma Via Sacra para o jornal “Legionário”, órgão que pertencia à Arquidiocese de São Paulo.
Os anos se passaram desde que em 1943 ele escreveu essa Via Sacra, mas ela continua atual. O passar do tempo trouxe a oportunidade de podermos ver que as considerações morais e sócio religiosas feitas pelo jovem intelectual católico para o público de 1943 podem ser lidas com proveito para os fiéis de 2019.
Jesus recebe a Cruz das mãos dos carrascos
Mas para isto, Senhor, é preciso paciência. Paciência pela qual se deixa, de braços cruzados e coração conformado, cair o dilúvio sobre a própria cabeça.
Paciência é a virtude pela qual se sofre para um bem maior.
Paciência é, pois, a capacidade de sofrer para o bem. Precisa de paciência o doente que, esmagado por um mal incurável, aceita resignado a dor que ele lhe impõe. Precisa de paciência aquele que se debruça sobre as dores alheias, para as consolar como Vós consolastes, Senhor, os que Vos procuravam. Precisa de paciência quem se dedica ao apostolado com invencível caridade, atraindo amorosamente a Vós as almas que vacilam nas sendas da heresia ou no lodaçal da concupiscência.
Precisa também de paciência o cruzado que toma a cruz, e vai lutar contra os inimigos da Santa Igreja.
É um sofrimento tomar a iniciativa da luta, formar e manter de pé dentro de si sentimentos de pugnacidade, de energia, de combatividade, vencer o indiferentismo, a mediocridade, a preguiça, e atirar-se como um digno discípulo daqu’Ele que é o Leão de Judá, sobre o ímpio insolente que ameaça o redil de Nosso Senhor Jesus Cristo.
Oh sublime paciência dos que lutam, combatem, tomam a iniciativa, entram, falam, proclamam, aconselham, admoestam, e desafiam por si sós toda a soberba, toda a empáfia, toda a arrogância do vício insolente, do defeito elegante, do erro simpático e popular!
Vós fostes, Senhor, um modelo de paciência. Vossa paciência não consistiu, entretanto, em morrer esmagado debaixo da Cruz quando Vô-la deram.
Conta uma piedosa revelação que quando recebestes das mãos dos verdugos a vossa Cruz, Vós a beijastes amorosamente, e, tomando-a sobre os ombros, com invencível energia a levastes até o alto do Gólgota.
Dai-nos, Senhor, essa capacidade de sofrer. De sofrer muito. De sofrer tudo. De sofrer heroicamente, não apenas suportando o sofrimento, mas indo ao encontro dele, procurando-o, e carregando-o até o dia em que tenhamos a coroa da vitória eterna.
É bom ter inveja de Simão Cireneu?
Simão Cireneu vinha de longe. Não sabia qual era a algazarra, o alarido, o vozerio que por vezes o vento lhe trazia.
Uma grande festa, provavelmente, tantos eram os risos, os brados, as vozes, que em animada sucessão se faziam ouvir. Aproximou-se.
Forte, jovem, cheio de vida, parecia num certo sentido a antítese do pobre Ser de túnica branca – a túnica dos doidos – coroa de espinhos, todo ensanguentado, um leproso cheio de chagas, que paciente e lentamente arrastava a Cruz.
O contraste serviu aos algozes de inspiração. Tomaram-no para ajudar Cristo, Senhor nosso, a carregar a Cruz. O Cireneu aceitou. A princípio, talvez por constrangimento. Depois, por piedade. Ficou na História, e, mais do que isto, conquistou para si o Reino do Céu.
Como é frequente esta cena! No caminho de nossa vida, vemos a Igreja que passa, perseguida, açoitada, caluniada, odiada, e, ó meu Deus, por vezes até traída por muitos que se dizem filhos da luz só para melhor poderem propagar as trevas. Vemos isto.
Na aparência a Igreja está fraca, vacilante, agonizante talvez. Na realidade, Ela é divinamente forte, como Jesus. Mas nós só vemos a fraqueza com os olhos da carne.
E somos tão míopes com os olhos da fé, que discernimos a custo a invencível força divina que a conservará sempre e sempre. A Igreja vai ser derrotada. Vai morrer.
Eu, pôr ao serviço dessa perseguida, dessa caluniada, dessa derrotada, a exuberância de minhas forças, de minha mocidade, de meu entusiasmo?
Nunca! Distanciemo-nos. Não somos Cireneus. Cuidemos só e só de nossos interesses. Seremos advogados prósperos, comerciantes ricos, engenheiros bem colocados, médicos de boa clientela, jornalistas ilustres ou prestigiosos professores.
E só no dia do Juízo é que compreenderemos o que perdemos quando a Santa Igreja passou por nosso caminho, e nós não a ajudamos!
Apostolado, apostolado, apostolado! Apostolado saturado de oração, impregnado de sacrifício. É este o meio pelo qual devemos ser Cireneus da Santa Igreja.
Meu Senhor, fazei com que sejamos tão fiéis a esta graça quanto o próprio Cireneu.
Oh, bem-aventurado Cireneu, rogai por nós.
João Sérgio Guimarães