Cidade florida, alegre e risonha – I
Na época medieval, a plebe levava uma vida serena, aconchegante e jubilosa, buscando o belo até nas pequenas coisas, como demonstram as construções existentes na cidade alemã de Rothenburg.
A cidade de Rothenburg foi construída na Idade Média e reflete inteiramente o espírito daquela época, cuja sociedade se dividia em três classes.
A mais alta era o clero, composta por homens consagrados a Deus e integra a estrutura de pessoas da Igreja Católica, Apostólica e Romana.
A segunda classe era a nobreza, a dos guerreiros, dos governadores de terras agrícolas no interior do país que, em caso de guerra, tinham a obrigação de combater. Serviço militar obrigatório só para os nobres, para os plebeus era muito restrito.
Depois, a plebe, cuja tarefa consistia em fazer a produção econômica do país.
Pequena burguesia e trabalhadores manuais
Habitualmente, quando ouvimos falar em Idade Média, pensamos em catedrais suntuosas, castelos magníficos, e temos razão, porque ela viu a construção e o acabamento de catedrais e de castelos incomparáveis. Mas nos perguntamos como seria a vida do pequeno burguês e do trabalhador manual. E a cidade de Rothenburg ob der Tauber nos dá uma resposta palpável a essa questão.
Tauber é o nome de um riozinho que banha essa cidade, a qual era fortificada porque poderia haver incursões de inimigos que quisessem tomá-la. E neste caso, os burgueses e os plebeus, morando na cidade, precisavam defendê-la. Então, eles tinham uma muralha que cercava a cidade, absolutamente fortificada como uma fortaleza medieval.
Mas dentro, pelo contrário, é uma cidade de trabalho, onde percebemos a vida da pequena burguesia ou do trabalhador manual. Naturalmente, as construções mais bonitas eram da pequena burguesia. Grande burguesia, como que não havia lá.
Preocupação de bom gosto e de arte em todas as coisas
Cada uma dessas casas não era residência de uma única família, mas constituíam os prédios de apartamento daquele tempo. Nos dois andares inferiores moravam pessoas mais abastadas, pois, como não havia elevador naquele tempo, para se chegar ao andar superior era necessário subir uma grande escadaria; e o aluguel ali era mais barato.
O prédio que vemos numa das fotografias é indiscutivelmente bonito. Não tem a beleza de um castelo, mas é digno, inteiramente diferente do que se poderia imaginar de uma favela ou um bairro operário de qualquer cidade moderna.
Há uma ideia de solidez, e percebe-se o aconchego que se tem em seu interior, o prazer de estar em uma casa como essa. Tem-se a impressão de que ali se come e se descansa bem, nos dias de feriado dormita-se bem… E na Idade Média o número de feriados era colossal!
Por exemplo, todas ou quase todas as festividades dos Apóstolos eram dias santos, e inúmeros outros, como festas de Nossa Senhora e de diversos santos da Igreja, os padroeiros de cada lugar, os Santos Anjos; em todas essas comemorações era decretado o feriado. Em dias de trabalho, trabalhava-se muito, nos dias de descanso descansava-se muito, e os havia em grande quantidade.
Nota-se nessas casas uma coloração discreta, porém não triste nem lúgubre, é uma cor agradável. Há uma preocupação de bom gosto e de arte em tudo.
As torres, o relógio, a muralha e a porta da cidade
Mais difícil de compreender para a ótica de hoje em dia talvez sejam essas duas torres. Não são torres de igreja, pois não se trata de construções religiosas, mas sim civis. Qual a razão de ser dessas torres?
Em geral é uma razão militar. A torre é construída de maneira que, dos mais altos andares, os guardas possam ver toda a circunvizinhança. Porque se algum exército está se aproximando, eles mandam tocar os sinos de todas as igrejas para acordar os cidadãos, que devem ir correndo até a muralha a fim de defender a cidade.
Com o tempo, isso foi se tornando mais raro e, no fim da Idade Média, constituiu-se o hábito de não mais fechar a porta da muralha à noite, e de construir as cidades sem muralhas, porque as condições da guerra mudaram e os combates entre cidades também foram desaparecendo.
Mas na Idade Média havia a preocupação de poupar espaço porque, como a cidade tinha que ficar dentro da muralha, com o passar do tempo iam se acumulando as construções umas em cima das outras. É a razão pela qual começaram a edificar prédios altos. E as torres eram construídas de maneira a deixar passar o pessoal em baixo, para ganhar espaço.
O relógio da torre é ornado, está colocado numa altura conveniente, e seu desenho é bonito. Naquele tempo não se usava ainda relógio-pulseira, nem de bolso. Portanto, era muito útil e prático haver vários relógios como esse na cidade para os cidadãos saberem as horas.
Na entrada da cidade, o aspecto fortaleza está mais acentuado. A porta deveria ter batentes de madeira grandes e fortes. E, para maior garantia, havia mais adiante uma segunda porta. De maneira que, se o inimigo conseguisse arrombar a primeira, ele atravessava um espaço pequeno e teria que recomeçar a batalha na segunda.
Os dois torreões no alto e o espaço coberto entre as duas torres têm um sentido muito prático. Por ali os defensores da cidade jogavam flechas, pedras, tachos com água ou óleo fervente para queimar os invasores.
Agora, deixemos de lado o aspecto prático e consideremos o estético. Essas torres e muralhas eram feitas com as pedras encontradas nas pedreiras da região. Como essas pedras colocadas ali dão um aspecto bonito! E como a linha geral dessa construção e da porta é bela!
Os dois torreões fazem uma harmonia; projetados para a frente eles ficam bonitinhos, leves, engraçadinhos, e dão um aspecto de simetria e de solidez à linda porta arqueada que forma um arco equilibrado e forte, cheio de reflexão. Mas atrás dele se levanta, como um braço, uma torre tão grande e tão majestosa que dá a impressão, diante do adversário, de um soldado de infantaria, de joelhos, esperando na estacada o ataque, enquanto o senhor feudal está em pé, armado de corpo inteiro para lutar.
Com o desaparecimento das guerras feudais, a vida se tornou mais amena. Então, foram-se abrindo portas menores para, tendo de passar alguma senhora idosa com roupa para lavar no rio da cidade, não serem obrigados a abrir portas pesadíssimas. Contudo, essas portinholas eram ainda muito fortificadas.
(Continua no próximo número)
Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 22/11/1986)